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31 de maio de 2010

Sem destino

Completo e detalhado - como sempre - este bem escrito obituário do NYT faz uma bela homenagem ao rebelde dos rebeldes, Dennis Hopper.

Veneno e amargura

Boa reflexão do jornalista Pedro Alexandre Sanches em seu blog. Ex-Folha e ex-Carta Capital, Pedro faz uma análise interessante sobre o papel do crítico. Um trecho:

Acredito que não precisamos, e nesse sentido me parece que perdeu muito sentido aquele estilo de escrita que o Tinhorão tinha e depois continuou com o Pepe Escobar, o Luís Antônio Giron, mesmo eu (aliás, se formos pensar, esse modelo nas últimas décadas ficou muito circunscrito ao núcleo "Folha"-"Veja", não é mesmo? Nunca foi muito a cara dos jornais cariocas, nem mesmo do "Estado", pelo menos no que se refere à crítica cultural). Mas aí há um ponto importante: isso não quer dizer que morreu o modelo de crítico ácido, que fala pelo fígado e cospe bile verde quando se expressa. O que eu acho que acontece nos últimos anos é que a internet virou tudo de ponta-cabeça. Se antes uma parte do público leitor aplaudia secretamente e se identificava em silêncio com o crítico ranzinza, amargo, recalcado etc., enquanto outra parte adorava usar essa mesma figura como bonequinho de vodu, hoje toda e qualquer pessoa tem a oportunidade de ir pessoalmente para um blog, um Orkut, um Twitter ou o que seja destilar suas próprias doses de veneno e amargura.
Mais no blog dele.

28 de maio de 2010

Quem sou eu?

Atire o primeiro e-mail quem nunca entrou na internet para digitar o próprio nome e tentar descobrir que lugar ocupa no cyberespaço. Levado por motivos tão díspares como a curiosidade e o narcisismo, a paranoia e o exibicionismo, quase todo mundo, pelo menos uma vez, quis conferir a quantas anda o ibope pessoal. Quase que naquela linha do "falem mal mas falem de mim". Esse ato não é isolado, é até bem comum, e tem nome: egosurfe. De acordo com esta matéria sobre pesquisa da Pew Internet, divulgada ontem, 57% dos adultos americanos admitiram ter procurado a si mesmos no buscador. A procura aumentou: em 2006 eram 47%.

Indo a um dos vários mecanismos de busca (no caso, o Google) e procurando um nome mais ou menos comum como o meu é possível achar um piloto de kart, um cantor gospel, um fotógrafo, um psiquiatra que mora nos Estados Unidos e um ex-prefeito de Miracema.

Nenhum deles sou eu.

O magnífico cigano

No ano de seu centenário, Django Reinhardt é lembrado em todas as latitudes. Uma bela homenagem é este perfil, escrito em julho de 1966, e que a Down Beat recupera de seus arquivos.

26 de maio de 2010

Eu quero uma casa na árvore

É um projeto que quase todo mundo já teve: morar numa cabana construída em cima de uma árvore. Porém, este delirante projeto é a negação do sonho que tem a singeleza como ponto principal. É a maior casa de árvore do mundo.

25 de maio de 2010

Sombras

Bom texto de um site dedicado a Thelonius Monk sobre a proximidade do genial pianista com sua mais conhecida mecenas, a baronesa Nica de Koenigswater.

Aliás, o jazz - e a música em geral - precisa de mais biografias escancarando a participação fundamental que estas figuras pouco conhecidas tiveram na carreira dos músicos.

20 de maio de 2010

Pretzels

Um dos símbolos de Nova York, o pretzel ganha status de iguaria segundo esta matéria do NYT.

Um dos destaques é a versão com presunto e queijo brie.

19 de maio de 2010

Beatles inédito

Boa matéria do El País revela que 38 fotos inéditas dos Beatles foram encontradas. Elas são do fotógrafo britânico Paul Berriff e ficaram mais de 40 anos esquecidas entre milhares de outros negativos em um porão.

18 de maio de 2010

Deus é argentino

Exemplo de um comercial que explora bem um tema já exaustivamente abordado. E ainda dá um banho nas latinhas que fazem sambar e cortar o cabelo.

17 de maio de 2010

José Onofre (1942 - 2009)

O jornalismo cultural talvez ainda não saiba a imensa dívida que tem com Zé Onofre, jornalista gaúcho com larga militância em alguns dos principais órgãos da imprensa brasileira. Amanhã faz um ano que ele morreu. Para lembrá-lo, destaco trechos de um texto que ele fez sobre Paulo Francis, um de seus grandes admiradores.

Paulo Francis: médico e monstro

Paulo Francis inventou no Brasil o jornalismo como espetáculo. Não era a informação, era Francis; não era a opinião, era Francis. Lia-se a coluna de Paulo Francis (1930-1997) sabendo que ela apresentaria um cardápio variado de pratos quentes. Até então, colunistas internacionais e locais dependiam de seu assunto (alguns só de seu texto) para trabalhar. Francis foi tornado ele próprio o núcleo de suas duas páginas semanais, primeiro na Folha de S.Paulo, depois no Estadão.

Ele estava sempre acompanhado de grande elenco: presidentes, políticos, atores, músicos, regentes, criminosos, vítimas, momentos da história, ídolos pop, cafajestes e tantos outros. Mas era tudo filtrado por um olhar cético e o que deveria ser o grande desfile de notáveis tornava-se uma fila de culpados numa delegacia, esperando sua vez de imprimir as impressões digitais e ser devidamente fichados.

Essa ausência da habitual vassalagem ao mundo político e cultural, aos poucos aproximou das páginas de Francis um grupo heterogêneo de insatisfeitos. Cobria todo o espectro: de leitores que estavam frustrados a jornalistas entediados com a mesmice de suas editorias. O caldo engrossou com o desembarque daqueles letrados abandonados pelos segundos cadernos que só tratavam do pop.

Francis tornou-se referência obrigatória, mas não uma unanimidade. Desde o início teve críticos de vários matizes ideológicos. As críticas aumentaram quando ele chegou à conclusão de que o Segundo e o Terceiro Mundo não poderiam criar um modelo próprio e se tornarem alternativas aos interesses das grandes transnacionais. Elas e os Estados Nacionais ricos eram a mesma coisa, faziam o mesmo jogo e suas preocupações sociais eram apenas sobre a melhor maneira de manobrar a força de trabalho.

14 de maio de 2010

24 horas

Nunca vi nenhum astrólogo ou estudioso do tema ter comentado a estranha, singular e genial conjunção astral que deve ter marcado as 24 horas que unem o dia 6 de julho de 1957 (quando John Lennon e Paul McCartney foram apresentados) com o dia 7 de julho de 1957 (quando Pelé faz sua estreia pela Seleção).

A música, o esporte, a cultura pop e a vida mundial não seriam mais as mesmas depois desta data.

Soneto de Tite

Poeta, letrista, jornalista e dramaturgo, Newton Lisboa Lemos Filho, o Tite de Lemos, foi múltiplo em múltiplas funções. Nasceu no Rio de Janeiro em 1942 e, a partir dos anos 60, passou a ter envolvimento com o teatro. Na década seguinte, ao lado de Guarabira, Luiz Carlos Maciel, Sidney Miller, Paulo Affonso Grisolli e Marcos Flaksman, escreveu o musical Alice no País Divino Maravilhoso. Ainda destacou-se como letrista (com parceiras com Sueli Costa, Francis Hime e Sergio Saraceni) e como poeta, publicando os livros Corcovado Park, Marcas do Zorro, Sonetos do Caderno e Outros Sonetos do Caderno. Morreu de câncer aos 47 anos em junho de 1989. Dele, destaco um soneto:

14 tortuosas linhas, 13
labirintos sem fim e sem começo,
12 portas lacradas, 11 vezes
forçadas, talvez 10, até me esqueço.

9 questões de lógica celeste
ou 8 jogos de adivinhação,
7 ou 6 tentativas, todas vãs,
de escutar o que ainda não disseste.

5 metáforas jogadas fora
quando quero dizer-te que te adoro.
4 rimas rebeldes, 3 tropeços,

2 tombos e no entanto, finalmente,
nada que não pudesse resolver-se
em 1 simples bilhete adolescente.

Stevie Wonder (4)

Martin Luther King Jr. Day é um feriado federal dos Estados Unidos, observado em todos os 50 estados, em homenagem ao reverendo que foi um dos maiores nomes da militância pelos direitos civis. A data é comemorada sempre na terceira segunda-feira de janeiro, próximo ao dia de nascimento de King, 15 de janeiro.

Stevie Wonder foi um dos principais defensores da causa, fazendo campanha aberta e compondo o hino Happy Birthday.

Por motivos semelhantes, 13 de maio poderia ser considerado o Stevie Wonder Day.

Stevie Wonder (3)

Veio do nascimento de Aisha Morris a inspiração para que Stevie Wonder compusesse uma de suas mais lindas composições, Isn't she Lovely. Atualmente com 35 anos, a bela filha do músico tem acompanhado o pai em turnês e gravações.

Na foto ao lado, Stevie aparece ao lado da filha em matéria de site de Santa Barbara, na Califórnia.

13 de maio de 2010

Stevie Wonder (2)

Está sendo lançada nesta semana Signed, Sealed and Delivered: The Soulful Journey of Stevie Wonder. biografia sobre Stevie Wonder escrita por Mark Ribowsky. A boa matéria do Times dá mais detalhes.

Stevie Wonder

Nenhuma outra pessoa - excetuando, obviamente, as que me são próximas - fez tanto por mim quanto Stevie Wonder.

É uma proximidade que nasce da distância. É uma intimidade que surge do acaso. É a maior, mais intensa e mais antiga admiração intelectual que carrego por alguém. Não sei quando passei a ouvi-lo e às vezes chego a acreditar que está na minha memória desde sempre. Ainda me surpreendo com a maneira como ele se recria. Ainda me emociono com gravações que conheço há mais de três décadas.

Hoje, quando ele completa 60 anos, comemoro como se fosse o aniversário de alguém muito próximo e reafirmo a certeza de que uma das maiores alegrias que posso ter é a possibilidade de dividir o mesmo tempo e o mesmo espaço na Terra com alguém como Stevie Wonder.

Stevie Wonder me ensinou a ouvir. Stevie Wonder me ensinou a amar. Stevie Wonder me ensinou a ver.
Obrigado por tudo, Stevie.

12 de maio de 2010

Eu quero uma casa no campo

Matéria do Daily News traz 63 fotos internas e externas das casas de celebridades americanas. Estão lá as casas de Penelope Cruz, Scarlett Johansson, Eddie Murphy, Steven Spielberg (a minha favorita, na reprodução ao lado), Brad Pitt e Angelina Jolie...

A legenda de uma delas diz: "Trabalho dos sonhos, mulher dos sonhos - e agora Tom Brady está fazendo a casa dos sonhos".

É o local onde o jogador americano vai morar com Gisele Bündchen.

11 de maio de 2010

Viva Mafalda!

Poucas pessoas afrontaram tanto os militares argentinos quanto uma menina de pouco mais de seis anos, desarmada, mas que com sua ironia, perplexidade, irreverência e revolta canalizava as insatisfações políticas e sociais, não só dos nossos vizinhos, mas de toda a América Latina. Condenada à infância e à irrealidade, Mafalda – criação mais genial do desenhista Joaquín Lavado, o Quino – continua sendo um dos personagens mais atuais da história do século 20 e um dos retratos mais bem acabados das mudanças contraculturais dos anos 60.

Foi em 29 de setembro de 1964 que a história da menina inconformada com a humanidade, que odiava sopa e que amava os Beatles foi publicada pela primeira vez no jornal Primera Plana, de Buenos Aires. Paradoxalmente, a garotinha que questionava a sociedade consumista havia surgido um ano antes, quando Quino atendeu a uma encomenda de uma agência de publicidade, que necessitava de uma personagem para uma campanha de eletrodomésticos. Os anúncios nunca foram feitos e Quino readaptou sua ideia. Deu tão certo que as aventuras de Mafalda e seus amigos Manolito, Felipe, Miguelito, Guille e Susanita passaram a ocupar regularmente as páginas de inúmeras publicações da Argentina e de outros países.

O autor – hoje com 78 anos, morando na Europa, se divididindo entre a Espanha e a França – parou de desenhar essa menina de cara redonda e cabelos escuros que conversava longamente com um globo terrestre sobre os conflitos e as injustiças sociais do planeta por ela ter crescido demais. Dez anos de piadas com os mesmos personagens pareceram-lhe uma eternidade. Quino não pretendia encerrar a carreira, apenas queria se dedicar a outros trabalhos. Ele abandonou Mafalda, mas ela não o abandonou. Até hoje seu nome é vinculado ao dela e Quino continua viajando pelo mundo para falar sobre sua mais perfeita invenção.

Nos conturbados anos 60 – dos Beatles e do Vietnã, de Martin Luther King e de Maio de 68, dos irmãos Kennedy e de Woodstock – Mafalda aprendeu com Che Guevara que era possível ser duro sem perder a ternura. E que nessa América Latina, onde Julio Cortázar disse que não importava o que ele pensava de Mafalda e, sim, o que ela pensava dele, não é de se espantar que Quino, quando resolveu congelá-la em 1973, deveria estar acreditando que muitos poderiam pensar que não foi ele quem criou Mafalda – mas ela quem criou ele.

Nove mais - Tom Jobim

Tom Jobim é sempre lembrado por Garota de Ipanema, Desafinado, Chega de Saudade, Samba do Avião, Corcovado, Wave...

Aí vão nove músicas de Tom Jobim que não são consideradas clássicas, mas deveriam ser:
  1. Caminhos Cruzados
  2. Chansong
  3. Chovendo na Roseira
  4. Demais
  5. Estrada Branca
  6. Falando de Amor
  7. Inútil Paisagem
  8. Marina
  9. Two Kites
Qual é a tua lista?

10 de maio de 2010

Nelson fala

Nelson Coelho de Castro fala muito. Tanto em conversas de bar quanto no palco. No belo show que apresentou na última sexta, tocando por quase duas horas, mais uma vez ele falou bastante. Nas duas conversas que teve comigo também falou muito. E mais: nas perguntas que lhe enviei as respostas igualmente foram longas. Como não pude usar tudo na matéria que fiz para ZH, achei que a boa conversa de Nelson não poderia ficar perdida. Por isso, reproduzo aqui a íntegra da nossa conversa por email:

Por que tanto tempo sem gravar?
Nelson - Depois de lançar o Da Pessoa em 2001 e, quase na mesma época, o Juntos 2 (com Bebeto, Gelson e Totonho), comecei a disputar nos projetos culturais do Fumproarte e da Petrobras o patrocínio de um novo disco. Rodava em ambos, seguidamente. No final de 2006 fui aprovado na Petrobras. Depois da natural jornada burocrática, a gravação prevista para 2007, pula pra 2009. Na manha, surfei no fluxo. A vontade de registrar um novo trabalho era grande durante este período, mas dependia, claro, de condições (recursos) que estes expedientes proporcionavam. Poderia ter gravado um disco, tipo, voz e violão. No entanto, com o parecer favorável da Petrobras, aguardei a melhor oportunidade. Valeu a espera.

As composições já vinham sendo feitas ou foram preparadas especialmente para o disco?
Nelson - Algumas vinham sendo feitas ao logo do tempo. Outras não.

É um disco de samba, certo? É a linguagem musical que tu melhor te comunica?
Nelson - Penso que é um disco de MPB e que tem samba. Faço samba instintivamente. Não me considero um “sambista”. Ficaria sob “rubor” com esta legenda. Mas o gênero samba sempre esteve nos meus discos. Como exemplo, no meu primeiro compacto tinha o samba Faz a Cabeça, 1979. No entanto, nos outros discos, havia também a valsa Armadilha, a marcha rancho Aquele Tempo do Julinho, a balada Ver-te Algo Teu ou o batuque afro de Vim Vadiá. Quer dizer, faço pocadinho de tudo. Lua Caiada tem sete sambas, mas tem ciranda, valsa, chorinho...Este disco, de certa forma, ficou mais coeso. Voltando. Da minha geração, acho, fui o compositor gaúcho que mais gravou sambas. Como em Porto Alegre, nos últimos quase 30 anos, a mídia de rádio está mais para o pop rock, quem faz MPB parece propor uma excentricidade. Mas isto vem mudando com o surgimento de novos grupos de sambas, melhor, de pagode “jovem”, também de uma nova geração de grandes músicos fazendo choro, samba de raiz nos bares da cidade baixa etc e com uma platéia expressiva!

Existe um samba feito no RS? Se sim, quais seriam as características desse samba?
Nelson - Sempre houve. Os compositores das escolas de samba de Porto Alegre, de Pelotas, de Uruguaiana, fora do período do carnaval, fazem samba. Mas ficam “nublados” depois da folia. No RS, podemos passar pelo Túlio Piva, Lupi etc ou pelo samba/rock do Bedeu. Mesmo na geração dos anos 60, influenciados pelos festivais e pela bossa nova, como Paulo e César Dorfman, Raul Ellwanger, Paulinho do Pinho, Giba Giba entre outros, havia o samba. Pena que muito pouco há de registro desta época. Poucos destes gravaram discos. A característica do samba gaúcho é a partir do Rio de Janeiro, mas isso se deu em todo o país. Antes do Rio, começa lá com o jongo, o samba de roda baiano, o samba chula, que vai ser seminal para o samba carioca no início do século passado. Depois vem a Rádio Nacional e.... Bueno, nossas etnias negras no sul vão dar um sotaque especial ao samba. Especialmente pelas religiões afro que aqui no sul são em grande número. Há, nos tambores, uma levada para cada entidade, assim por diante. Por exemplo, em se tratando de carnaval, as baterias das Escolas de Samba de Pelotas tem outra “levada”, mais manhosa e menos marcial que as de Porto Alegre. Basta ver, ouvir as charangas, tanto dos times Brasil ou do Pelotas, em comparação com as do Inter ou do Grêmio num jogo qualquer. Na do Brasil, inclusive, a charanga usa o Sopapo. Uma maravilha.

Quem são os compositores que te inspiram?
Nelson - A MPB toda dos anos sessenta: Chico, Milton, Caetano, Gil, Edu Lobo, João Gilberto, também a Jovem Guarda e dantes como Lamartine, Ari Barroso, Dorival, Lupi... Escutei também música americana, música clássica e o rock londrino dos Beatles e Rolling Stones. Uma salada das buenas.

Explique um pouco melhor aquela tua tese que me falaste no Tuim, de que as pessoas precisam se "esbarrar" mais?
Nelson - na verdade, somos, nesta província, um bando de aquários lindeiros e estes com as suas faces vítreas justapostas, translúcidas, onde todo mundo se vê, se reconhece, mas as águas não se visitam e muito menos os peixes. Nos apartamos por pueril estranhamento, medo e preguiça. Um exemplo disso. Nos anos sessenta, as TVs locais possuíam na sua grade de programação conteúdos produzidos regionalmente. Para tal, era necessário artistas, atores, cantores, orquestras, redatores, cenógrafos, apresentadores, etc... na sua maioria vindos do Rádio. Com o surgimento do vídeotape, e logo após das transmissões via satélite, acontece a “natural” debandada destes profissionais das emissoras locais. Simples: os conteúdos vinham prontos das matrizes de São Paulo e Rio de Janeiro, e com custos bem mais baixos. O legado é que interessa à tese. Uma filigrana: os edifícios das emissoras locais ficaram áridos, até mesmo fóbicos, à cultura regional com a ausência daqueles profissionais. Só agora se retoma isso. 50 anos depois. Esse seria dos lugares que poderíamos “esbarrar” com a classe artística em suas diferentes praias. Em 1980, numa entrevista, falei: os porto-alegrenses só se vêem de manhã, ao escovar os dentes. Isto mudou um pouco, com a TV produzindo curtas gaúchos e as rádios executando a música daqui sem o embaraço de antes. Culpa dos lúcidos conspiradores nestas mídias Cabe a nós re-significar isto. Ainda há tempo.

Tango flamenco

Boa matéria da edição de hoje do La Nación falando sobre o cantor Diego el Cigala e apresentando a inteligente mistura musical que ele anda fazendo com o flamenco e o tango.

8 de maio de 2010

Balançando

Luiz Carlos Miele (nascido em São Paulo, em 1938) é um nome experiente do showbiz brasileiro. Foi um pioneiro na televisão e traz um currículo que inclui trabalhos ao lado de Elis Regina, Roberto Carlos, Wilson Simonal, Pery Ribeiro, Sarah Vaughan, Sérgio Mendes, Lennie Dale e, principalmente, Ronaldo Bôscoli.

No vídeo abaixo, dentro de uma homenagem a Wilson Simonal, Miele divide o palco com Simoninha, filho mais velho e herdeiro musical do grande cantor.

7 de maio de 2010

O profeta do kaos

Músico, jornalista, poeta e escritor, Jorge Mautner é, principalmente, o profeta do kaos. E o kaos – com K, como gosta de frisar – é, para Mautner, uma linha de pensamento idealizada por ele em 1956 e que perdura até hoje, defendendo que o homem deve ser o protagonista de um movimento revolucionário, anarquista, pacifista, democrático e cultural. Com um visual andrógino e num cenário que parece tirado da Praça da Alegria, Mautner interpreta uma de suas composições dos anos 70, Guzzy Muzzy.

6 de maio de 2010

Eu quero é botar...

Maldito entre os malditos, Sérgio Sampaio sempre esteve à margem, mais até do que alguns de seus contemporâneos que nunca foram bem aceitos pela indústria fonográfica como Jorge Mautner, Jards Macalé e Luiz Melodia. Este último, inclusive, foi o responsável por algumas homenagens ao compositor capixaba ao regravar Cruel e Que Loucura!

Seu desvio artístico era claro e pode ser resumido por uma história emblemática: em 1978, Sampaio se apresentava no Teatro Opinião, no Rio. Quando cantava a música Pobre Meu Pai, um gato preto, que morava no teatro, colocou-se a sua frente e só levantou quando a música acabou. A história entrou para o folclore musical e o próprio Sampaio fazia questão de espalhá-la para exaltar as tragédias e os azares de sua vida.

Artista autodidata e intuitivo – "Músico é Hermeto, Egberto. Eu não sou. Toco no violão como quem toca no corpo de uma mulher sem saber as zonas erógenas", explicava –, Sampaio sempre fez questão de viver na periferia artística. Costumava encarar o fracasso quase como uma filosofia de vida e, às vezes mesmo de maneira amarga, gostava de brincar com o próprio insucesso.

Conterrâneo de Roberto Carlos – os dois nasceram em Cachoeiro do Itapemirim –, Sampaio chegou a flertar com o sucesso com a explosão de Eu Quero É Botar Meu Bloco na Rua, marcha-rancho com levada pop que trazia na letra um acento de protesto. A canção se transformou num dos maiores hits de 1972 e, na época, ele chegou a ser apontado por uma revista como sucessor do Rei. Debochado, Sampaio apressou-se em ridicularizar qualquer comparação, mandando o seguinte recado em Meu Pobre Blues: "E agora que esses detalhes / Já estão pequenos demais / E até o nosso calhambeque não te reconhece mais / Eu escrevi um blues/ Com cheiro de uns dez anos atrás / Que penso ouvir você cantar".

Apesar da iconoclastia, Sampaio nunca se recuperou de ter perdido a efêmera fama passando a ter nas duas décadas seguintes uma carreira inconstante, quase sempre atrapalhada pelos problemas alcoólicos e pelas internações. Morreu no dia 15 de maio de 1994, aos 47 anos, vítima de uma crise de pancreatite.

5 de maio de 2010

O último playboy

"Elas vinham até mim". Foi assim que Jorginho Guinle (1916 - 2004), quando esteve pela primeira e única vez em Porto Alegre em outubro de 2000, explicou como conseguiu manter casos amorosos com algumas das mulheres mais belas e desejadas do planeta. A declaração, feita em voz baixa, não continha nada de presunção. Afinal, durante décadas, Jorginho Guinle se acostumou a ser o centro, o ponto de convergência, dos mais ecléticos grupos.

Em um século marcado pela efemeridade, pelos 15 minutos de fama, Jorginho Guinle resistiu com charme e elegância à toda decadência de uma vida social da qual ele foi um dos protagonistas. Último remanescente de uma legião romântica de cafajestes nacionais (Mariozinho de Oliveira, Ibrahim Sued), internacionais (Frank Sinatra, Sammy Davis Jr., Peter Lawford e Dean Martin) e genuínos playboys (Porfírio Rubirosa e Ali Khan), Jorginho Guinle foi um mestre em ter um estilo de vida que privilegiava a cultura, o glamour e o hedonismo.

Discreto, Jorginho Guinle pouco falava dos vários romances que teve durante sua vida. Mas sabe-se do seu envolvimento com Jayne Mansfield, Kim Novak, Romy Schneider, Rita Hayworth, Anita Ekberg, Lana Turner, Ava Gardner e Marylin Monroe – está última quando ainda ela era Norma Jean e que Guinle conheceu em 1947 na casa de Alfred Bloomingdale, dono da cadeira de lojas .

Nos anos 30, 40, 50 e 60 não foram poucos os astros que vieram ao Brasil – de graça – apenas atendendo a um convite do playboy, que abria as portas do Copacabana Palace. Sua lista de amigos era um who's who da política, dos negócios e das artes, aí incluídos os Kennedy, Judy Garland, Orson Welles, Ella Fitzgerald, Nelson Rockefeller, Howard Hughes, Dizzy Gillespie, Liza Minnelli e Tony Bennett. Jorginho Guinle fez mais pelo turismo brasileiro do que todas as embraturs da época.

Herdeiro de uma fortuna que incluía hotéis, navios e comércio de café, Jorginho Guinle soube dar ao patrimônio o destino que merecia. Sempre gastou muito e se divertiu mais ainda. "O segredo do bem viver é morrer sem um centavo no bolso. Mas acho que errei o cálculo", dizia, ironizando a própria sorte e o fato de ter sido tão longevo. Nunca trabalhou. Entre as atividade que ficariam na fronteira entre o trabalho e o prazer, Jorginho chegou a escrever algumas colunas e lançou o livro Jazz Panorama, escrito no final dos anos 50 e pioneiro na análise da música americana feita por um brasileiro.

Quando lançou o livro de memórias Um Século de Boa Vida fez uma balanço de 70 anos de vida social e reduziu sua importância no jet-set internacional declarando "levei uma vida modesta". Modéstia.

(Márcio Pinheiro)

Histeria macarthista

Em recente visita ao Brasil, o jornalista Carl Bernstein quase sempre é lembrado como o co-autor de Todos os Homens do Presidente, deixando de lado outros tantos bons livros que escreveu. Um destes - sem dúvida o mais biográfico - é Loyalties (Lealdades), em que lembra sua infância e a vida com os pais, militantes de esquerda durante o macarthismo.

Publicado em 1990, depois de uma vida de reflexões e de cinco anos de trabalho duro, Loyalties traz a confissão de Bernstein de que ainda eram muitas as feridas abertas pela histeria anticomunista. Tão grande que Bernstein precisou convencer os pais que um livro como aquele já poderia ser escrito passadas três décadas desde o final das caças às bruxas. Se os adultos eram perseguidos, os filhos sofriam as consequências. Em Loyalties, Bernstein relatou o que foi ter sido um "red diaper baby" (bebê de fralda vermelha), expressão criada para os filhos das vítimas do macarthismo e como, durante anos, foi assombrado por um fantasma que parece estar em todos os cantos.

(Márcio Pinheiro)

4 de maio de 2010

Touro indomável sem destino

Foi o paraíso na Terra. Durante pouco mais de uma década, os filmes que saiam de Hollywood surgiam na cabeça dos diretores. Eram eles – e só eles – que tinham direito de levar à tela o que bem entendessem. O início foi com Bonnie & Clyde, lançado em 1967, e serviu para revelar uma geração que incluia Peter Bogdanovich, Hal Ashby, Martin Scorsese, Francis Ford Coppola, os irmãos Schrader, Robert Altman, George Lucas e Steven Spielberg.

Os anos loucos em que essa turma deu as cartas estão em Como a Geração Sexo-Drogas-e-Rock’n’roll Salvou Hollywood: Easy Riders, Raging Bulls (Editora Intrínseca), livro do jornalista americano Peter Biskind com primorosa tradução de Ana Maria Bahiana. Publicado originalmente há mais de dez anos, o livro continua atual. É o mais detalhado e escabroso relato de como esse diretores – auxiliado por atores como Warren Beatty, Jack Nicholson, Peter Fonda, entre outros – assumiram o controle da produção cinematográfica americana depois da falência dos grandes estúdios.

A Nova Hollywood era ousada e atrevida. Tinha coragem para propor e realizar filmes com temas polêmicos – Máfia, Vietnã, suicídios, drogas, homossexualismo, serial killer – e dinheiro para gastar. O resultado se refletiria em filmes como O Poderoso Chefão, Chinatown, Tubarão, Ensina-me a Viver, Sem Destino e Touro Indomável.

O sonho acabaria no começo dos anos 80, com o megafracasso O Portal do Paraiso, de Michael Cimino, filme que custou US$ 50 milhões e faturou apenas US$ 1,5 milhão.Os garotos de ouro entraram em desgraça e quase todos eles enfrentaram pesada tragédias pessoais. Mas nestes 13 anos desta primavera eles ganharam muito dinheiro – e se divertiram muito.

Casas com pés de barro

Boa matéria do jornal argentino Página 12 sobre a região de Tinogasta, onde uma série de pacatos povoados conservam casas, igrejas e outras construções feitas há seculos com alguns dos materiais mais básicos da humanidade: barro e água.

3 de maio de 2010

Lobisomem animado

E, por fim, Wolfman Jack seria a fonte de inspiração de outro ícone da cultura pop, o desenho animado Monstros Camaradas – nos Estados Unidos, Groovie Goolies, que apresentava um power trio formado por três monstros: Frankenstein, Drácula e o Lobisomem. Frankenstein, tocando um instrumento de percussão feito de ossos, era o mais tonto e, sempre que dizia uma besteira, era atingido por um raio. Seu bordão era: “Eu não merecia isso!”. Mais afetado, o Drácula era emo (ou seria hemo?). Estava sempre segurando a capa de maneira lânguida, corria na ponta dos pés e tocava piano com gestos delicados. E o Lobismem era o doidão. Com traços e voz inspirados em Wolfman Jack, o monstro peludo pilotava um skate e tinha um estilo hippie, com uma fala cheia de gírias.

O velho lobo do rádio

Por falar em Big Boy uma de suas mais fortes referências - comentada nesse documentário - é a do disc-joquei americano Wolfman Jack (1939 - 1995). Com a figura que lembrava um lobisomem, a voz grave e o gosto por filmes de terror, Wolfman Jack mudou o panorama radiofônico americano com seus uivos sonoros.

Um grande garoto

O inconfundível "Hello crazy people" era a marca registrada do mais revolucionário disc-joquei dos rádios brasileiros. A figura rotunda e espaçosa de Big Boy (nascido Newton Alvarenga Duarte em junho de 1943) rapidamente tornou-se facilmente reconhecida pelo público jovem. Era engraçado e anárquico, não respeitando padrões e ajudando a revelar novos sons a ouvidos pouco acostumado a novidades. Parte da sua revolução é lembrada nesse documentário. Uma vida vivida de maneira intensa demais cobrou seu preço rapidamente e Big Boy morreu com 33 anos, sufocado por um ataque de asma, num quarto de hotel em São Paulo, em março de 1977.